quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Black!




O pé de jambo e a mangueira acolheram o corpo imóvel, já não tinha a respiração ofegante e delongada, descansava. Lembro, em nosso primeiro encontro um calafrio perpassou meu corpo, na época infantil, misto de medo e admiração. Intrigava-me com sua agilidade, seus movimentos bruscos, carinhos, curiosidade e fome! Como tinha fome! Papai deu-o uma panela inteira de angu e carne e mesmo assim reclamou, nada era o bastante.
Disseram ser mistura de raças ! Talvez por isso tão inteligente! De onde será que veio a mania de comer na frente da TV e sempre sentado, seu bom humor, companheirismo e o saber quando a família ia para chácara afim de descolar uma carona?! Quantas vezes as lágrimas rolavam em minha face e ele apenas deitava-se ao meu lado, colocava uma das patas em meu colo e esperava paciente, depois cutucava umas vezes, levantava, como a dizer: “Vem, levanta também, não é isso que vai te derrubar!”.
Há tantas cenas hilárias para recordar...Mas não há tempo, os trapos velhos envolvem o corpo débil, o túmulo já está aberto e eu me despeço, entre soluços. Ainda ontem circulava a piscina, olhando fixamente em busca de um carinho. Suas barbas brancas escondiam ternura e fervor pela vida, mesmo nos dias mais difíceis, de perna quebrada e tudo, dava-se um jeito para comer bem e beber água da privada ( de certo deve ser melhor do que a da tigela), já sofria reumatismo e afins, mas pulava ligeiro no carro para não ficar sozinho, parecia mais um bezerro em seus quarenta quilos, de puro osso no final.
A morte escolhe o dia e que belo dia fez hoje, o sol se pôs em cor fluorescente e a lua gigante invadiu o céu...Pensou-se em São Francisco de Assis e no mesmo instante três latidos precederam o silencio. Obrigada por esses latidos audíveis pela fala de meu pai... Uma despedida, um suspiro final, um agradecimento, não sei! Contudo, tenho certeza, foram fortes e únicos, dignos de um Black imortal, inesquecível.
A terra cobre a cova e a esperança paira no ar, um dia, não muito longe, reencontrarei esse companheiro fiel, não velho, com 13 anos e cheios de problemas, mas o filhote, bisbilhoteiro e fujão! E o amarei de novo, como no primeiro encontro!

2 comentários:

Felipe Lima disse...

Parece que vai um pedaço nosso junto, não é? Acho que vai mesmo, mas reconheço a morte como a única legitimidade da vida. É a nossa única certeza. Boa sorte.

mmm disse...

é kakau.. tive muita convivencia com esse cachorro meio humano..=) ele entendia a gente.. época que namoravamos ele sempre tava junto com a agente.. ate pular a janela ele pulava..hauhaia não sabiamos se era medo ou vontade de estar perto.. tinha olhos que viam alem.. sempre me recorddarei dele.. grande black..=) tudo de bom pra vc e boa sorte kau nas poesias.. essa ficou muito boa..=)o black ficaria orgulhoso de vc..hauaihuia bjão!