domingo, 12 de outubro de 2008

Viva a padroeira do Brasil!



" Ave cheia de graça, bendita, sejas mãe. Te amo com amor eterno, sincero, de coração. Quero então colocar minha vida em suas mãos. Sentir que podes guiar-me mãezinha com a tua proteção...Eu quero deixar que teu plano em mim, possa realizar sem limitações e quero tentar, sem porém saber ser um pouquinho do que tu és..."

Esboço - Diálogo.

( No hospício. A cantarola e B acompanha, mas com outra música, no final parece uma só. Em crescente até o silêncio absoluto. )

A: Alô!
B: Oi! Você aqui de novo?!
A: Pois é... ainda esperando os correios saírem de greve!
B: Como assim?!
A: Ué! Vai dizer que você não sabia?! Por isso não chegam as cartas da minha família!
B: Já faz tempo?! E eu que não sei o que estou fazendo aqui...
A: 3 anos!!! 3 longos anos!!! É um absurdo!Esse governo...

( chega um terceiro)

C: Oi! Não pude deixar de escutar... Desculpa, é que sou novato aqui... Muito tempo aqui?! Uma curiosidade...Porque estão aqui?!
A: Eu estou esperando cartas... Há 3 anos! Nunca recebi cartas...Culpa da bosta desse correio!
B: Não sei...Um dia cheguei em casa, meu marido estava na cama com outra mulher...Peguei meus filhos e fui viajar...Queria que eles experimentassem algo novo, libertá-los, me libertar...
C: Conseguiu?! Porquê queria aprender como...

( chega uma mulher, morde um deles)

A/B/C: Aí, sai pra lá seu cão! Parece um animal!
D: Não fui eu! Eu juro! Não foi...
A/B/C: não vê que está sendo inconveniente? estamos conversando, sai fora!
D: eu fico!

( durante a conversa morde-os e sempre nega o ato até se estressarem e a expulsarem, ela sai negando, em gritos decrescentes, pode virar uma musica, vários não fui eu, por exemplo...)

C: Voltando ao assunto... Me ensina?!Conseguiu?!
B: Eu não! eles sim...Pulamos do alto!No rio Tietê, achei que tinha alcançado a liberdade, mas não! Vim parar aqui e nem sei quanto tempo faz...Uns dias talvez, meses, anos?!
A: E eles te mandam cartas?!Tá esperando a carta deles?!
B: Não, não! Eles estão no colo de Nossa Senhora, graças a Deus... Só eu fiquei no inferno.
C: Eu também queria... Ah sim! Morrer! De ontem pra cá já tentei me matar duas vezes, não deixam, me sedam... Nem me matar eu posso... Por isso tô sem roupa. ( na verdade está vestido)
B: Ué! Mas você tá vestido...
C: Tá louca?! arrancaram minhas roupas quando eu tentei me enforcar! Na semana passada!
B: Ainda bem que estou viva... Posso receber as cartas a qualquer momento!
A: Aqui podia ter visitas neh?
C: Verdade! Estou com saudades dos meus meninos...
A: Mas ninguém viria me visitar...Meu marido poderia vir...( fala sozinha) Estrangular... Minhas próprias mãos...
C: Eram dois por mês, um em cada cidade...
B: Seus amigos, primos, irmãos?
C: Namorados oras! Pena que duravam pouco...
A: Você se parece com meu marido...
C: Ah... Violência, sinto falta da violência...Alguém tem uma faca?!
B: Porque?!
C: Agarrá-los à força...Esquartejar, pedacinho por pedacinho... Vocês tinham que ver a cara de prazer deles...Depois?! A lata do lixo!
A: Meu marido... (olha para C) Você?!
C: O ser humano é podre! podre!!!Hipócrita!!! Tenho nojo... Podre!
A: Você parece com o meu marido...

( A enforca C com o escapulário que tem no pescoço. Apagam-se as luzes. Gritos.)
Uma manhã, corpo sobre o divã e nada,
nem um músculo se move
Enfático esse medo sordido de morrer por uma mordida.

A vida passa repassa distrata e acaricia
perdida entre as esquinas invisivéis
impercepitível ou perceptível demais
( não saber o pior incomoda)

Faço trocas por uma poesia engajada
Algo não amorfo
irradiante, purgante, excruciante!
Mas sou órfã de mim mesma
Traída pelo egocentrismo
Escorregadia, pegajosa, encebada por todas as manchas do mal do mundo.

Isole-me em uma camisa de forças antes do veneno consumir
O ódio - me pulsa
O amor - me repulsa
O vem e vai contínuo da minha insatisfação
estatelada sobre as almofadas.

Eu não choraria por mim...

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

" Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo."

Carlos Drummond de Andrade,
trecho de "As sem-razões do amor"

terça-feira, 7 de outubro de 2008

A garota era quieta, bonita, usava sempre algo de vermelho, sentava-se entre o meio e o fim da sala de aula, arrastava um sotaque nordestino e andava desfilando.
Primeira vista era pura futilidade, roupa da moda, cabelos escorridos... Nas aulas de penas umas duas vezes o professor chamou sua atenção, pois segundo ele lixar unhas não fazia ninguém aprender!
Detalhe: entrega de provas. A garota antes leviana e estereotipada tirou SS!!!
Hoje tivemos uma surpresa, o professor trouxe sessenta lixas, umas pretas outras amarelas e distribuiu para a turma, disse que tinha encontrado a solução para aumentar a nota!!!
Vou começar a cuidar mais das unhas pra ver se recompenso meu MM injustificável, a não ser pelas prioridades desmedidas.

Rascunhos (toscos) sobre amoras.

*

Amora manchou o branco lençol
Escorregou por meus dedos
- Me lembrou minha infância.

**

Cingiu de púrpura meus lábios e a ponta do indicador direito. Meus olhos apreendem os detalhes- bolinhas unidas, minúsculas, em uma só estrutura. " Como uma árvore tão grande pode dar frutos tão pequenos?" indagava eu menina.
A língua reconheceu o gosto, arrepio gostoso pelo corpo: o ouvido temente da palavra NAMORO.
Amor, amora.
Quero namorar com as frutinhas, flertar com os longos galhos da árvore ( progenitores do meu medo de quedas). Foram eles os acolhedores da minha fúria adolescente, dos meus desejos de fugir de casa e da minha primeira paixão - as folhas secaram minha saudade sem medida e a desilusão, sem saída.Hoje são da minha preguiça.
Meus filhos, tenho certeza, virão sem as minhas manchas e descobrirão as suas próprias debaixo da amoreira, desbravarão os sentidos em suas raízes.
A vida em espiral.
Jamais contarei ao pai deles suas desventuras amorosas, ou então assim o farei e morderei na risada o gosto da minha infância. As palavras veementes e alegres do meu pai ainda ecoam: " Kakau, quer amora?! Vou contar pro seu pai que você namora!", depois em pontas de pés, toda envergonhada, tentando alcançar sozinha o fruto mais saboroso era embalada por um timbre macio a cantarolar. " Amora, amorinha, quero uma amora para minha filhinha!"
Espero ainda a sombra, meus filhos, meu pai, vivo!!! Para repetir com os netos as proezas que fez com a filha. Minha espiral progredirá, enquanto isso ensaio um sorriso cálido para a minha árvore preferida.

domingo, 5 de outubro de 2008


Tenho medo de me afogar nos meus medos.

Foto por Kauê R.